Viver sem ler é perigoso.

Resenha || Os Pequenos Homens Livres: a primeira grande aventura de Tiffany Dolorida



  Título da Série: Discworld (30º livro) e Tiffany Dolorida (1º livro)
  Título do Livro: Os Pequenos Homens Livres
  Autor: Terry Pratchett
  Editora/Tradução: Bertrand Brasil/Ludimila Hashimoto
  Páginas: 304
  Ano de Publicação: 2016
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Sinopse Um perigo oculto, saído de pesadelos, vem trazendo uma ameaça diretamente do outro lado da realidade. Armada com tão somente uma frigideira e seu bom senso, a pequena futura bruxa Tiffany Dolorida deve defender seu lar contra fadas brutais, cavaleiros sem cabeça, cães sobrenaturais e a própria Rainha das Fadas, monarca absoluta de um mundo em que realidade e pesadelo se entrelaçam. Felizmente, ela contará com uma ajuda inesperada: os Nac Mac Feegle da região, também conhecidos como os Pequenos Homens Livres, um clã de homenzinhos azuis ferozes, ladrões de ovelhas, portadores de espadas e donos de uma altura de mais ou menos quinze centímetros. Conseguirão eles salvar as terras quentes e verdejantes de Tiffany?

i always follow back

A leitura de Pequenos Homens Livres marcou meu grato retorno ao Discworld de Terry Pratchett. Com seu humor irreverente e a narração irônica, essa foi a segunda vez que fiquei triste de verdade ao finalizar uma obra. A primeira vez foi com Pequenos Deuses, também do autor. Essa obra inaugura a série de Tiffany Dolorida aqui no Brasil, que será publicada pela Editora Record através do selo Bertrand Brasil. Foi a primeira vez que tive um vislumbre dos Nac Mac Feegle e a cada vez que apareciam, eu ria sozinha. Continuo abismada com o quanto uma série infanto-juvenil consegue ser atemporal e agradar a todas as faixas etárias.


A aventura começa em Pequenos Homens livres quando Miss Tick, ou Perspicácia Tick, uma bruxa, vê ondulações no universo que demonstram que algo grandioso está acontecendo. A confusão ocorrerá no Giz, lugar onde ela até interveria, se seus galhos não tivessem dito que já havia uma bruxa ali – e bruxas não adentram o território de outra para interferir em coisas importantes sem pedir licença (isso é sinal de extrema falta de educação!).




“Não, isso não pode estar certo. Ali fica a terra do giz (...) Não dá pra se formar uma boa bruxa no giz. É um material quase tão macio quanto argila. É preciso uma boa rocha dura e firme para se formar uma bruxa, acredite.”

O que ela faz, então? Observa. Enquanto isso, na terra do giz em si, Tiffany Dolorida presencia o início de sua primeira aventura quando uma criatura estranha, como aquelas que vemos nos pesadelos e livros de contos de fadas, aparece para ela e para o irmão babão e chato, Wentworth, que não dá uma trégua e só quer saber de doces. Ainda que não tenha consciência sobre o que é e acredite que bruxas existem apenas nas histórias, ela prova para Miss Tick, que a observa constantemente, que a Terra do Giz não é um material tão mole assim. Especialmente quando seu irmão mais novo (grudento, insuportável e chorão) é roubado por uma Rainha que só quer saber de mimá-lo em seu mundo encantado. 


O enredo

Tiffany Dolorida é uma garota de nove anos, nascida e crescida em uma fazenda, que nem imagina a responsabilidade que tem nas mãos: ser a nova bruxa responsável pelo Giz. Esse papel foi ocupado anteriormente pela Vovó Dolorida, embora Tiffany só tenha descoberto isso muito depois de sua morte. Durante todo o livro, a garota tem flasbacks em que recorda de determinadas atitudes e frases da avó, finalmente associando ao que de fato ela foi em vida. Agora cabe a ela a responsabilidade de cuidar de tudo e todos, e garantir a segurança e o bem-estar não apenas de sua família, mas de cada habitante daquela região.
No entanto, antes mesmo de tomar consciência disso tudo, Tiffany é colocada à prova pela Rainha, que coloca o seu mundo para colidir com o da garota. Os primeiros sinais de que algo está errado aparecem aos poucos (Jenny Dente-Verde, uma criatura horripilante, aparece no lago; os Nac Mac Feegle alertam a garota; por fim, Wentworth, seu irmão mais novo e babão, é raptado). Com o auxílio dos Pequenos Homens Livres, de Miss Tick (mais precisamente de seu sapo), dos Pensamentos Melhores, dos Pensamentos Melhores Ainda e da Primeira Visão, Tiffany embarca na aventura de entrar na terra mágica da Rainha e roubar trazer seu irmão de volta.
“Você sabe o que vai aparecer? Todas as coisas que foram presas e trancadas naquelas histórias velhas. Todas as razões para não se desviar do caminho, não abrir a porta proibida, não dizer a palavra errada ou não derramar o sal. Todas as histórias que provocaram pesadelos nas crianças. Todos os monstros que saíram de debaixo da maior cama do mundo. Em algum lugar, todas as histórias são reais e todos os sonhos se tornam verdade.”



Os Pequenos Homens Livres

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ARTISTA DESCONHECIDO.

São os Nac Mac Feegle, ou os Pctisies. Pertencem a uma raça encantada, o que não significa que são encantadores: medindo poucos centímetros, seus hobbies são roubar, brigar e xingar. Têm pavor de advogados e vício em Unguento Especial de Ovelha. Um dia trabalharam para a Rainha, mas na história detestam-na. Aparecem pela primeira vez para Tiffany logo no começo do livro, chamando-a de bruaca (que significa bruxa), embora ela nem imaginasse o que fossem aquelas criaturas e o quanto eles a ajudariam a resgatar o seu irmão.
Os Nac Mac Feegle possuem uma kelda, que é basicamente a rainha de todos eles e a única cuja responsabilidade é pensar. Se os pequeninos são força bruta e confusão, a kelda é o cérebro de todos. No livro a atual Kelda está prestes a morrer e no lugar de passar seu posto à Fion, sua filha, passa à Tiffany (o que causa espanto em todos os Nac Mac Feegle, especialmente quando percebem que um deles terá de se casar com a parruda, conforme ditam as regras sociais, para que tenham muitos filhos e povoem ainda mais a comunidade – mas Tiffany dá um jeito de driblar isso).
Os “poderes” dos Nac Mac Feegle incluem uma força descomunal, a capacidade de entrar e sair de qualquer mundo e a impossibilidade de abandonarem um banquete sem antes consumir toda a bebida. Além disso, eles possuem pequenas espadas que brilham na presença de um advogado – referências a Senhor dos Anéis, alguém?


As bruxas Dolorida


“Os que podem fazer têm que fazer pelos que num podem. E alguém tem que falar pelos que num têm voz.”

Vovó Dolorida e Tiffany têm algo em comum: aceitam responsabilidades sem hesitar e encontram soluções para problemas aparentemente “insolucionáveis”. Tiffany vai um pouco além e é mestra em criar novas palavras. E tem a Primeira Visão, os Pensamentos Melhores e, descobre mais tarde, os Pensamentos Melhores Ainda. Não apenas será uma bruxa da melhor qualidade, como também é um ser humano e tanto.
Ter a Primeira Visão e os Pensamentos Melhores significa que Tiffany vê o mundo sob um ângulo só seu. Quer dizer também que o mundo está a lhe contar segredos a todo instante, e que aquilo que muitos não veem, não lhe passa despercebido. Uma bênção e uma maldição.
Uma coisa engraçada sobre Tiffany e Vovó Dolorida, aliás, é que as duas nunca foram de conversar muito. Elas ficavam em silêncio juntas, porque compreendiam uma a outra, e isso era o mundo para Tiffany. Por isso que, quando tinha sete anos e a avó partiu, apesar de não ter derramado uma lágrima, ela sabia de uma coisa: o mundo havia acabado. Dentro dela, de um jeito só dela.

         “Cê tem aquela partezinha dentro de você que fica lá firme, certo? Aquela pequena partezinha que cuida do resto de você. A habilidade de ter Primeira Visão e Pensamentos Melhores é o que cê tem, e isso é um pequeno dom e uma grande maldição pra você. Vê e ouve o que os outros num conseguem, o mundo revela os seus segredos pra você, mas você é sempre como aquela pessoa na festa segurando a bebidinha num canto, que num consegue se enturmar. Tem uma partezinha dentro de você que num quer derreter e derramar. É da linhagem de Sarah Dolorida mesmo. Os rapazes trouxeram a menina certa.”



A Rainha dos Elfos


Segundo a Kelda, a rainha está apenas testando Tiffany e por isso roubou Wentworth. Quer ver do que é feita a nova bruxa responsável pelo Giz. Em sua terra, o tempo passa muito devagar – anos aqui são dia lá. Além disso, como é o lugar onde os sonhos são reais, passar muito tempo na terra da Rainha pode fazer com que você nunca mais consiga acordar direito nem diferenciar a fantasia da realidade. São os riscos que Wentworth corre, além de só retornar ao mundo real quando todos estiverem mortos e ele for, ainda, uma criança.
É uma terra infestada por fadas, dromos (criaturas que tecem sonhos e fisgam você por tempo suficiente para depois consumi-lo) e todo o tipo de coisas ruins. Uma terra que rouba um pouco de cada mundo e acaba reunindo os piores pesadelos de todos eles. Tiffany, com os Nac Mac Feegle e sua frigideira, enfrenta todos eles para resgatar o irmão e provar à Rainha que ela não é invencível – e que não se mexe com uma Dolorida.

“O segredo não é sonhar (...) O segredo é acordar. Acordar é mais difícil. Eu acordei e sou real. Eu sei de onde venho e para onde vou. Você não pode mais me enganar. Nem me tocar. Nem tocar qualquer coisa que seja minha.”


Opinião final

Terry Pratchett nos deixou há pouco tempo, mas imortalizou a si mesmo em sua escrita. Ele possuía um modo todo peculiar e sarcástico de ver o mundo: colocou isso em suas obras e nos fornece, a cada vez que lemos, reflexões profundas sobre questões que nem imaginávamos. Seus livros são cheios de críticas sociais descaradas e que fazem você dar um sorrisinho de lado durante a leitura. É o segundo livro que leio do autor, mas com certeza ainda virão muitos mais pela frente. Convido você a embarcar no Discworld junto comigo e diversos outros leitores - acredite: você não está velho demais para ler esse infanto-juvenil. É o tipo de leitura que irá agradar o seu filho, você e o seu pai. É uma leitura que transcede e se eterniza.

“Pensando assim, o livro nunca dava provas de nada. Ele falava sobre um ‘belo príncipe’... mas era ele belo mesmo, ou só porque era príncipe as pessoas o chamavam de belo? E a ‘menina que era tão linda quanto o amanhecer’... bom, que amanhecer? No solstício do inverno quase não havia luz ao amanhecer! As histórias não queriam que você pensasse, só queriam que acreditasse no que contavam...”



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