Viver sem ler é perigoso.

Os Irmãos Karamázovi || #LendoDostoiévski - Parte 1


Oi, gente! Após tanto tempo sumida, trago aqui pra vocês um novo projetinho pessoal que comecei esse ano influenciada por meu namorado e um amigo. Resolvi deixar meus preconceitos de lado e embarcar na leitura de Dostoiévski, autor russo que eu jamais imaginei que leria. Sempre fui bem contumaz quanto aos tipos de leitura que colocaria na minha estante, seguindo o raciocínio de que a vida é curta demais pra gente ler o que não curte.
Bom, eu ainda estou no capítulo X de Os Irmãos Karamázovi, mas aqui deixo uma reformulação da frase que sempre guiou minha vida de leitora: a vida é curta demais pra gente não dar chance pra livros que podem ser maravilhosos, só porque não queremos dar o braço a torcer.
Vamos à resenha?


A primeira coisa que notei com Os Irmãos Karamázovi é o quanto a leitura é difícil. Quem me acompanhou no Instagram (segue lá!) nos primeiros dias viu o tanto que eu demorei pra achar a leitura minimamente agradável. Provavelmente o fato de a edição ser 1971 (!) não colaborou muito no início, embora hoje em dia esse seja um dos fatores que mais me prende ao livro.
Pra ser bem sincera com vocês, ainda não entendo como uma narrativa tão real e crua está conseguindo manter minha atenção. Eu, apaixonada por aventuras cheias de fantasia, me vejo folheando as páginas de um romance considerado o mais importante da literatura mundial que não possui sequer um elemento fantástico. É no mínimo bem estranho.



Não dá pra dizer que estou amando o livro, ou que é a melhor leitura da minha vida. Mas o fato de eu conseguir chegar tão longe com uma obra que jamais compraria com certeza merece crédito. Estou muito envolvida com as minhas personagens favoritas (Aliócha e Ivã), bem como com Smierdiákov e Mítia, e curiosíssima pra saber até onde vai a petulância de Grúchenhka e Fiódor Pavlovitch.
O mais fascinante sobre o livro, além de ter essas personagens que em sua maioria não são nada carismáticas, mas conseguem ser intrigantes, é o tanto que ele suscita alguns embates internos que de outra forma jamais seriam acendidos dentro de você. Ivã, intelectual atormentado pela própria inteligência, foi aquele que mais me fez refletir, em especial no Capítulo V – Assim Seja!, em sua discussão filosófica com outras personagens, quando abordou um artigo que escreveu. Neste artigo, em suma, apresentou sua ideia segundo a qual a Igreja deveria deixar de ocupar um canto no Estado para absorvê-lo por inteiro, em especial em questões sobre justiça, por exemplo, e que esta absorção deveria ser o objetivo da sociedade cristã. Um trecho que merece destaque aduz o seguinte:


Se a Igreja absorvesse tudo, excomungaria o criminoso e o refratário, mas não cortaria as cabeças. Pergunto-vos: aonde iria o excomungado? Porque deveria, então, não somente separar-se das pessoas, mas do Cristo. Pelo seu crime, insurgir-se-ia não só contra as pessoas, mas contra a Igreja do Cristo. É o caso, atualmente, sem dúvida, no sentido estrito, no entanto não é proclamado, e a consciência do criminoso de hoje transige muitas vezes: “Roubei”, diz ela, “mas não vou contra a Igreja, não sou o inimigo do Cristo”. Eis o que diz frequentemente o criminoso de hoje. Pois bem, quando a Igreja tiver substituído o Estado, ser-lhe-á difícil falar assim, a menos que negue a Igreja a terra inteira: “Todos”, diria ele, “estão no erro, todos se desviaram, a Igreja deles é falsa, somente eu, assassino e ladrão, sou a verdadeira Igreja cristã”. É dificílimo manter esta linguagem, supõe isto condições extraordinárias, circunstâncias que raramente existem. Atualmente, considerai de outra parte o ponto de vista da própria Igreja para com o crime: será que não deveria modificar-se em oposição ao de hoje, que é quase pagão, e, de meio mecânico de cortar um membro gangrenado, como se pratica atualmente para preservar a sociedade, transformar-se totalmente na ideia da regeneração do homem, de sua ressurreição e de sua salvação?...

Esse é apenas um dos trechos do capítulo que me marcou profundamente. Perdi a conta de quantas vezes o li, e a cada troca de argumentos só conseguia sentir aumentar minha admiração por Ivã. Não estou aqui pra discutir questões filosóficas como as que ele suscitou, mas mesmo que você discorde de seus ideais, ao ler compreenderá o quanto seus argumentos são incisivos e inteligentes.
Outro ponto positivo de ler uma obra desse calibre e ainda em uma edição datada de 1971 é o tanto que consegui enriquecer meu vocabulário. Anotei todos os verbos, adjetivos e substantivos estranhos num bloco de notas e aqui estão alguns deles que passei a adotar no meu dia a dia (mesmo que inconscientemente!): envilecer, prosternar, predizer, apoquentar, tresandar, invectivar, estertorar, mujique, peroração, enleio, réprobo, estroinices, melíflua (me tornei fã desse adjetivo!), anacoretas, galimatias...


Enfim. Acabo de finalizar o capítulo 10 e ainda há muitos pela frente. Estou levando um tempo de leitura absurdamente longo, mas tudo bem, pois esse não é um livro pra ser lido com pressa, muito menos devorado. Se você for lê-lo como eu li – ou seja, sem experiência com obras do gênero –, saiba que será diferente de todos os livros com os quais você já se aventurou. Mas tudo bem, esse é só mais um ponto positivo da obra.





  Título: Os Irmãos Karamázov (Brat'ya Karamazovy)
  Autor: Fiódor Dostoiévski
  Ano de publicação original: 1879
  Editora/Tradução: Martin Claret/Herculano Villas-Boas
  Páginas: 911
  Onde Comprar: Compre na Amazon e ajude o Me Livrando!
  Este livro faz parte do projeto #LendoDostoiévski.







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